Marcello Veríssimo

Um golpe antigo, que a cada nova denúncia se renova, mas que não deixa de cultivar a sua essência: tirar vantagem ilícita a custas dos outros. O estelionato, por definição no dicionário, é a fraude praticada em contratos ou convenções, que induz alguém a uma falsa concepção de algo com o intuito de obter vantagem ilícita para si ou para outros.

Apesar de deixar muita gente no prejuízo, a legislação judicial brasileira não considera o estelionato um crime grave. De acordo com o Tribunal de Justiça, para ser considerado crime a fraude precisa ser caracterizada por quatro requisitos, além da obtenção de vantagem ilícita e de causar prejuízo, precisa ser utilizada alguma artimanha e enganar ou induzir a vítima ao erro.

Foi justamente o que pode ter acontecido com o administrador Pedro Corgnati, que morava em Caraguatatuba. Ele denunciou o caso de um suposto golpe de estelionato que estaria sendo praticado na região com vítimas também em São Sebastião e na capital paulista. Pedro diz que perdeu aproximadamente R$ 500 mil. “Esses criminosos pegam o dinheiro das vítimas para fazer apostas, mas ganhando ou perdendo a vítima nunca mais consegue ver o dinheiro”, disse o administrador.

Ainda não se sabe ao certo o número de vítimas e nem o valor total lesado, mas Pedro disse que são altos na casa dos R$ 40 mil. Ele disse que caiu no golpe em setembro do ano passado e foi se dar conta somente no mês de janeiro deste ano.

O administrador registrou boletim de ocorrência (B.O) na delegacia de Caraguatatuba e o caso segue sob investigação em sigilo com o delegado Jairo Luis Pinto Pontes. A reportagem do JDL obteve acesso ao B.O. (veja na imagem abaixo), registrado no dia 16 de fevereiro. “Eles diziam que tinham uma estratégia secreta para ganhar nas apostas esportivas. Os lucros seriam divididos meio a meio, metade para eles, metade para nós. Mas o dinheiro nunca veio”, disse o administrador. “Eles prometiam grandes lucros com pequenos investimentos, acertando cotas altíssimas. A estratégia deles era bem convincente ”, disse.

Para se ter uma ideia, em uma das apostas feita no dia 4 de setembro de 2022, com R$ 50 em uma partida entre o Paris Saint Germain e o Shakhtar, da Ucrânia, na cota 701.00 os ganhos ultrapassam R$ 35 mil. “A partir deste momento a vítima só sabe o que acontece na conta baseado nos prints que eles enviam, e enviam sempre, prints de jogos vitoriosos, prints forjados de saldos cada vez maiores. Todos os dias tinham diversos novos prints, toneladas deles”, disse Corgnati.

Além dele, também existem relatos de aproximadamente outras seis vítimas que seriam conhecidas de Pedro. “Depois disso eles fazem a captação do dinheiro das vítimas (ou em uma conta de apostas no nome das vítimas ou pedem para a vítima enviar o dinheiro que o estelionatário irá jogar na própria conta dele”, diz Corgnati.

A possibilidade de lucro fácil e rápido impede as vítimas de enxergarem o óbvio, que se trata de um golpe. Os acusados de estelionato, já foram identificados pela polícia como L.B. e J.R.S., desenvolveram uma estratégia milagrosa que mostra resultados altíssimos.

Em outra aposta feita no dia 13 de setembro, em um jogo entre Chelsea e Praga, na cota 151, com R$ 50 os ganhos ultrapassam R$ 7,5 mil. De acordo com as vítimas, o modus operandi dos acusados é o mesmo em ambas as situações quando a conta utilizada na casa de apostas é a da vítima.

Os acusados convencem a vítima que não poderão acessar mais a conta de L.B., que é o autor de uma estratégia que demorou muito tempo para ser desenvolvida e que ele não iria compartilhar com ninguém. “Eles [os golpistas] alteram a senha, o email e o celular para a recuperação da conta e a partir deste momento a vítima só sabe o que acontece por meio dos prints”.

Pedro também disse que arrolou como testemunha a esposa de um dos supostos golpistas. De acordo com ele, a mulher, identificada como F.A., diz possuir todas as senhas e acesso aos saldos de todas as contas dos clientes, e caso seu marido “venha a faltar” seria ela que devolveria o valor aos clientes. Outro fator primordial para a concretização do golpe.

Saque

Quando a vítima tenta sacar o dinheiro, os acusaqdos as convenciam que a casa de apostas tinha confiscado o dinheiro e bloqueado a conta. “Para conseguir validar esta história, a dupla de golpistas ainda enviava um e-mail para a casa de apostas se passando pela vítima, dizendo que estaria viciada em apostas e que isto estaria prejudicando sua vida pessoal e profissional e que deseja acionar o setor responsável”, disse Pedro. “A casa de apostas por procedimento padrão encerra a conta e faz o banimento do CPF da vítima da plataforma, impedindo assim da vítima recuperar o acesso à conta”.

Engrenagem

Como todo esquema, o golpe das apostas funcionava assim como uma engrenagem em que cada peça é responsável por uma próxima fase.

A vítima investiu R$10 mil e esse dinheiro some em poucos dias. De acordo com a denúncia que o JDL obteve acesso, um mês depois é enviado para a vítima uma imagem forjada da conta com saldo de 20 mil reais, (10 mil de investimento + 10 mil de lucro), sendo que nestes 10 mil de lucro incide a comissão de 60%.

A vítima então deposita ou na conta do L.B. ou da esposa F.A. outros R$ 6 mil referente ao pagamento da comissão pelos ganhos.

É como um ciclo vicioso que se repete mês após mês com todas as vítimas até que acabe o dinheiro de cada uma delas. No momento em que acaba o dinheiro de uma vítima e ela tenta fazer o saque, os acusados alegam que a casa de apostas fez um bloqueio na conta dela e se utilizando de um email fraudado, conseguem que a casa de apostas efetivamente encerre a conta da vítima.

E vão fazendo esse processo com diversas vítimas ao mesmo tempo, cada uma em sua parte do processo.

Outro Lado

Um dos acusados por Pedro Corgnati, L.B., via ligação telefônica pelo watsapp, negou as acusações e ainda afirma que a suposta vítima não diz a verdade pois a mesma seria sócia nas apostas. Ele não quis dar mais detalhes sobre o assunto. O espaço continua aberto para os acusados prestarem seus esclarecimentos diretamente ou por meio de seus advogados.

Polícia

O caso é investigado pela Delegacia Central de Caraguatatuba, sob o boletim de ocorrência número CF6319-1/2023. A reportagem do JDL procurou o delegado responsável pelo caso, mas ele não quis dar entrevista.

A Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo também não respondeu aos questionamentos do JDL até o fechamento desta reportagem. O espaço está aberto e será atualizado assim que a SSP se manifestar.

By srneto

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