Para dependentes químicos, vacina anti crack é paliativo e não é páreo contra a doença da adicção

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Marcello Veríssimo

Com o crescimento dos problemas na Cracolândia paulistana e a repercussão no noticiário, o anúncio da criação de uma vacina que pode ser considerada uma esperança para os dependentes químicos, principalmente de cocaína e crack também gerou uma espécie de “cortina de fumaça” sobre o assunto.

A vacina Calixcoca, desenvolvida pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) tem por objetivo ser terapêutica e funcionar como um tipo de tratamento contra alergias. “A intenção não é prevenir, mas tratar a dependência de cocaína e crack”, disse o professor e pesquisador Frederico Garcia, da UFMG.

Ele explicou aos jornalistas que o funcionamento do imunizante acontece a partir de uma molécula inédita que foi sintetizada. “Quando injetada, passa a produzir anticorpos anti cocaína, que se ligam à droga quando consumida, e impede que ela passe por barreira encefálica”, disse o pesquisador, que ainda defende que, desta forma, a droga não consegue acionar o circuito de recompensas no cérebro. “A grande dificuldade do dependente são as recaídas, que acionam o recurso de compulsão”. “O paciente ideal é o que conseguiu interromper o uso da droga, em clínicas, por exemplo, e usa a vacina antes de retomar a vida, para maximizar o efeito”, completou o professor da UFMG.

A vacina está na chamada fase pré-clínica, em que apresentou bons resultados de eficácia e segurança em animais. O imunizante manteve os anticorpos em camundongos e macacos por até um ano.

Cortina de Fumaça

Por mais que os especialistas tenham avançado nos ensaios clínicos do imunizante, que apresentou resultados promissores na redução do impacto da droga em animais, ainda existe um longo caminho a ser percorrido para se resolver o problema do uso de drogas no país.

É o que dizem os próprios dependentes químicos com que a reportagem do JDL conversou na noite desta quarta-feira (14) nas ruas do Litoral Norte. Para escapar do sofrimento e de todas as mazelas que o uso de drogas causa, o morador de rua Cleber, nome fictício, disse ser favorável ao imunizante, mas que o medicamento precisa ser destinado, principalmente para quem não tem condições de pagar. “Sou a favor, desde que não seja mais uma manobra e que seja muito bem explicado como o imunizante age no cérebro. Isso tudo só está acontecendo por causa da Cracolândia, da violência que acontece no centro de São Paulo, então a sociedade está desesperada por uma solução”, disse o homem, que atualmente usa maconha e cachaça, mas contou que usa qualquer tipo de droga, menos o crack.

O Relatório Mundial sobre Drogas de 2022, do
escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), mostra que cerca de 284 milhões de pessoas, entre 15 e 64 anos, usaram drogas em 2020, índice 26% maior do que dez anos antes.

Somente no Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, o SUS (Sistema Único de Saúde) registrou mais de 400 mil atendimentos de pessoas com transtornos e comorbidades causadas pelo uso de drogas em 2021. A reportagem do JDL não conseguiu encontrar os dados atuais do ano passado no SUS e em sites do Ministério da Saúde.

Para a dependente química Priscila, que está em recuperação por meio da frequência em reuniões de irmandades anônimas, a vacina é uma ilusão. “Sou adicta cruzada, sou pós graduada em dependência química e conheço os dois lados da história tanto da doença quanto do tratamento, da recuperação e sou totalmente contra, acho essa vacina uma estupidez” disse Priscila, que está limpa há 15 anos, frequentando as salas de recuperação.

O dependente químico Danilo disse que existe uma diferença entre quem é escravo da droga, os chamados adictos, e quem é “abusador de substâncias” em algum ponto ou período da vida. “Sou a favor de qualquer tentativa, não sou contra. Existe quem consegue beber socialmente e ir embora para casa, quem fuma pedra e para, mas para quem é dependente não funcionaria”, disse ele, que está limpo há 13 anos, 6 meses e 24 dias. “Adictos são portadores da doença da adicção, obsessão e compulsão, perda total de controle e para estes a vacina talvez não seja efetiva, pois o problema não é a droga e sim o próprio indivíduo. E essa vacina trata a droga e não o paciente”.

Os dependentes químicos ouvidos nesta reportagem tiveram os nomes trocados para preservar suas identidades.

DQ – A psiquiatra Silvia Scolfaro, médica responsável pelo atendimento a dependentes químicos na Comunidade Terapêutica Restitui, em Caraguatatuba, disse que apenas uma vacina anti cocaína não é a solução para os problemas relacionados à dependência química, uma vez que trata-se de um acontecimento multifatorial.

A médica atendeu a reportagem do JDL na noite desta quarta-feira (13) e disse que o ser humano é um indivíduo biopsicossocial. “Existe quem considere espiritual também; junte-se essa definição a DQ (dependência química) e chegamos a conclusão que mesmo com a vacina haverá a necessidade que essa pessoa, portadora da DQ, busque tratamento para o seu corpo, para sua mente e reavalie o meio em que vive”, disse ela. “Vale ressaltar que a vacina seria destinada apenas para usuários de cocaína e derivados. Estou há 22 anos em contato direto com portadores de DQ, desde o grau mais simples, até aqueles que chegam a desenvolver psicose pelo abuso ou até pela abstinência”, completa a especialista.

A médica ainda alerta que, em toda a sua trajetória profissional, observa que são raros os casos de compulsão por uma única substância, sendo o alcoolismo a maior evidência de substância psicoativa única. “No uso de psicoativos ilícitos, dentro da nossa realidade, o comum é encontrar o usuário de maconha, cocaína e crack. Nos últimos anos, acrescentamos a essa lista as drogas k2, k4 e k9, ou spice, que são identidades da mesma droga sintética onde a diferença está na forma de consumo”.

De acordo com a médica, mesmo que a vacina chegue ou não, o tratamento contra a dependência química, uma doença multifatorial, deve ser realizado por equipe médica multidisciplinar em saúde mental, com foco na doença da dependência química. “Tal tratamento pode ser ambulatorial, ou internado, quando a situação é de risco pessoal ou social”.

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