Marcello Veríssimo
O preconceito, o conservadorismo e a falta de visibilidade ainda são alguns dos obstáculos que brasileiros da comunidade LGBTQIAP+ ainda enfrentam para buscar espaço todos os dias na sociedade.
Embora mudanças importantes tenham sido conquistadas nos últimos anos, quem não dispõe de privilégios precisa se defender todos os dias.
O STF (Supremo Tribunal Federal) tornou crime a homotransfobia há cinco anos, mas o delito ainda está enquadrado na lei do racismo, com pena de 2 a 5 anos de cadeia.
Para se tornar real a pauta ainda depende que o Congresso Nacional aprove uma legislação específica.
De acordo com reportagem da Folha de São Paulo, nesta quinta-feira (13), o que se vê atualmente é que nenhum caso do tipo foi contabilizado pela Justiça brasileira, pela falta do chamado assunto processual específico para o preconceito contra pessoas homoafetivas. Para a Justiça, todo tipo de crime desta natureza é considerado racismo.
A reportagem da Folha questionou o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), mas não obteve resposta sobre a falta de registros.
O único mapeamento disponível é realizado por entidades da sociedade civil organizada, entre elas o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que contabiliza os registros desde o ano de 2020, com 111 casos registrados na Justiça.
De lá para cá, o que se viu foi a curva ascendente com aumento de 353% no número de notificações, sendo 328 em 2021, e 503 em 2022, o último ano com dados disponíveis.
Cerca de 20 milhões de brasileiros, cerca de 10% da população, se identificam como pessoas LGBTQIAP+, de acordo com a
ABGLT (Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais).
Capacitação
Uma das queixas apontadas pela reportagem da Folha de São Paulo é a falta de capacitação dos agentes da polícia em tratar do assunto.
Um dos casos que ganhou repercussão recentemente foi o do jornalista Rafael Gonzaga, 33, agredido com seu namorado e Adrian Grasson, 32, em uma padaria no bairro Santa Cecília, na região central de São Paulo.
Rafael disse ao jornal Folha de São Paulo que, enquanto a polícia não for capacitada adequadamente para lidar com crimes de ódio contra grupos minorizados, pouca coisa mudará e a comunidade LGBTQIAP+ seguirá “com esse gargalo no processo de busca por justiça”.
A ativista pelos direitos a políticas públicas das LGBTs do Litoral Norte, Thifany Félix, 54, concorda. Ela conversou com o JDL nesta quinta-feira (13), disse já ter sido vítima de haters na internet e que encontrou apoio na DDM (Delegacia de Defesa da Mulher) de Caraguá. “Quando sofri transfobia busquei a Delegacia da Mulher e todos deveriam fazer isso”, disse Félix.
De acordo com ela, que é solidária ao jornalista da capital, ideal seria que toda delegacia fosse capacitada para atender e acolher vítimas de crimes de racismo e homofobia. “Caraguatatuba ainda não possui casos assim de ataques a homossexuais com frequência. Mas quando a pessoa não assume que foi homofobia, não podemos falar por ela”, conta a ativista, que assim como Rafael Gonzaga espera que, pelo menos, alguma política pública aumente o número de delegacias especializadas neste segmento por todo o país, que atualmente possui índice de 92,5% de violência contra LGBTs. “A minha sorte foi que não aconteceu nada, mas poderia ter acontecido, eu recorri à delegacia, mas não tive retorno”.
Para Félix, a decisão de denunciar o caso e repercutir pela cidade pode ter assustado seu assediador. “É lamentável que ainda não exista esse serviço no estado ou no país, e termos de ser equiparados ao racismo, que é tão grave quanto”, alerta.