Em entrevista coletiva concedida na manhã desta quinta-feira (28), os representantes das instituições que deflagraram a Operação Carbono Oculto definiram a ação como um golpe no “andar de cima” do esquema do crime organizado que se infiltrou no setor de combustíveis.
“Informações davam conta de ações do Primeiro Comando da Capital na economia formal através de fintechs, de fundos de investimento e de atividades envolvendo combustíveis”, disse o procurador-geral de Justiça, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa.
“A partir deste Procedimentos de Investigação Criminal o Ministério Público identificou, mais uma vez, a necessidade de ação colaborativa”, enfatizou o PGJ, destacando a articulação do MPSP, por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), com Ministério Público Federal, a Polícia Civil e a Polícia Militar, a Receita Federal do Brasil, a Secretaria de Estado da Fazenda, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo.
“No Estado de São Paulo a gente já tem mais de 3.000 documentos apreendidos, uma centena de computadores, HDs, material probatório que vai reverter para essas investigações”, disse o promotor de Justiça Yuri Fisberg, que agradeceu a cooperação dos GAECOs de Goiás, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Paraná, Rio de Janeiro e Santa Catarina.
“O que nós identificamos é que a organização criminosa atua em todas as etapas da cadeia de combustível, a iniciar pelas usinas, distribuidoras, formuladoras de combustíveis, redes de postos e também nos portos”, revelou o promotor João Paulo Gabriel.
Os secretários Guilherme Derrite (Segurança Pública), Samuel Kinoshita (Fazenda) e Robinson Barreirinhas participaram da entrevista, bem como Márcia Cecília Meng ( superintendente da 8ª Região Fiscal), Carlos Eduardo Neri de Oliveira (superintendente de Fiscalização e Abastecimento da ANP e Thiago Matos (da Procuradoria-Geral do Estado).
Operação
Desde as primeiras horas desta quinta-feira, uma força-tarefa – composta por cerca de 1.400 agentes do Ministério Público de São Paulo (MPSP), por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), Ministério Público Federal, por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO, da Polícia Federal, das Polícias Civil e Militar, da Receita Federal do Brasil, Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo, Agência Nacional do Petróleo (ANP) e Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo (PGE/SP), por meio do Grupo de Atuação Especial para Recuperação Fiscal (GAERFIS), cumprem mandados de busca e apreensão e prisão nos Estados de São Paulo, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Paraná, Rio de Janeiro e Santa Catarina, contando com apoio dos respectivos GAECOs do Ministério Público de cada Estado.
O objetivo dessa ação integrada das instituições, denominada Operação Carbono Oculto, é desarticular um intrincado esquema colocado em prática por organizações criminosas investigadas de participação fraudulenta no setor de combustível, com infiltração de integrantes da facção Primeiro Comando da Capital (PCC), lesando não apenas os consumidores que abastecem seus veículos, mas toda uma cadeia econômica.
A organização criminosa PCC está associada a uma rede de organizações criminosas, cujos vínculos são estabelecidos de forma permanente ou eventual, e convergente, de modo a assegurar a efetividade das atividades econômicas ilícitas, notadamente por meio da sua inserção na economia formal, como é o setor de combustível e o sistema financeiro.
Segundo as investigações, os mais de 350 alvos – pessoas físicas e jurídicas – são suspeitos da prática de crimes contra a ordem econômica, adulteração de combustíveis, crimes ambientais, lavagem de dinheiro, fraude fiscal e estelionato. As irregularidades foram identificadas em diversas etapas do processo de produção e distribuição de combustíveis.
Um dos principais eixos da fraude investigada passa pela importação irregular de metanol. O produto, que chega ao país pelo Porto de Paranaguá (PR), não é entregue aos destinatários indicados nas notas fiscais. Em vez disso, é desviado e transportado clandestinamente, com documentação fraudulenta e em desacordo com normas de segurança, colocando em risco motoristas, pedestres e o meio ambiente. O metanol, altamente inflamável e tóxico, é direcionado a postos e distribuidoras, nos quais é utilizado para adulterar combustíveis, gerando lucros bilionários à organização criminosa.
Em várias redes investigadas, em mais 300 postos de combustíveis, foram detectadas fraudes tanto qualitativas quanto quantitativas. Consumidores estariam pagando por volumes inferiores ao informado pelas bombas (fraude quantitativa) ou por combustíveis adulterados fora das especificações técnicas exigidas pela ANP (fraude qualitativa).
Vale destacar, ainda, que proprietários de postos de gasolina, que venderam seus estabelecimentos comerciais, não receberam os valores da transação e foram ameaçados de morte caso fizessem qualquer tipo de cobrança.
O produto e proveito das infrações econômicas e penais foram realocados em uma complexa rede de interpostas pessoas que ocultam os verdadeiros beneficiários em camadas societárias e financeiras, especialmente em shell companies, fundos de investimento e instituições de pagamento. Parcela substancial desses recursos sem lastro financiou a aquisição de usinas sucroalcooleiras e potencializou a atuação do grupo que absorveu em sua estrutura criminosa distribuidoras, transportadoras e postos de combustíveis.
As transações financeiras do grupo transitam por fintechs controladas pelo crime organizado, cujo portfólio de clientes é formado majoritariamente por empresas do setor. De acordo com os responsáveis pela investigação, a escolha por uma instituição de pagamento – em vez de bancos tradicionais – visa a dificultar o rastreamento dos recursos. As fintechs operavam com contabilidade paralela, permitindo transferências entre empresas e pessoas físicas sem que os beneficiários finais fossem identificados.
Além das medidas de natureza criminal, o Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos do Estado de São Paulo (CIRA/SP) adotará providências judiciais para bloquear bens suficientes para recuperar o tributo sonegado, cujo montante atualizado é estimado em R$ 7.672.938.883,21.
